quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Mayã, uma idéia de paz


Acontece bem agora o que agora eu lhe conto
Se bem que o lugar e a hora não interessam, no entanto
Somente para aquele homem, que dizia a todo instante
Que o lugar onde se mora e o tempo são importantes

Era um homem descontente, tenso, com rugas na fronte
Vivia o tempo de ontem e via uma passa­da à frente
Sonhava um novo horizonte, com outro tipo de gente
E deitava sobre a ponte dormindo manemolente

Sentia‑se um gavião, mas com asas de urubu
Uma espécie de "galant” com ares de jeca tatu
Cochilando preguiçoso, mas querendo ganhar braços
Ficava ainda mais nervoso com esse eterno descompasso
Eh, sonolência! Eh, mormaço!

Um certo dia acordou com uma luz em sua cara
Será que a sombra acabara e a água fresca também?
O anjo da anunciação mandou fa­zer as bagagens
Mas quem levaria na viagem? Pensou um pouco... ninguém

E rodou tantas cidades que chegou à conclusão
Que não te­ria paixão por mais cidade nenhuma
E pensou, ali consigo, que essa ou aquela estrada
Não seria nada, nada, nada mais que só mais uma

Mas chegando a um vilarejo, deparou‑se numa praça
Com a luz, a bele­za e a graça de uma formosa mulher
Ela chorava em silêncio e entre cuidadoso e ousado
Foi caminhando ao seu lado e seja o que Deus quiser

Sem dizer uma palavra. Valia ouro, a palavra
Não é nada, não é nada, não seria só mais uma
Já não sentia vontade de interromper o silêncio
Toda cautela e prudência seria pouca, ou nenhuma

Ela cho­rando, ele ali, passadas vivas na noite
Foi‑se o tempo. Tudo foi‑se com ele, naquelas horas
E ao chegar na casa dela, previu a separação
Disparou‑lhe o coração, mas teria que ir embora

Pôs o chapéu na cabe­ça, se agasalhou num pulôver
Sem saber o que houve, sem ouvir a sua voz
Queria ao menos um adeus mas depois caiu em si
Que qualquer palavra ali seria muito pros dois

E foi abrindo caminho por entre as sombras e o frio
Quando, de repente, um "psiu" tomou de impacto a praça
Ela entrou e a porta aberta era para ele um convite
Ele achou tudo bonito e deu graças a Deus, graças...

Quando acordou de manhã, ela já havia saído
E para onde tinha ido, a essas alturas não importa
Encontrou ali na mesa frutas, café, pão e leite
Além de um simples bilhete: “Quando sair bata a porta.”

O mistério e a beleza abraçaram‑se num só
E a partir daquele instante o mundo ficou maior
Só aí teve a certeza, a certeza sem medi­da
Que mais que nunca na vida, seguiria a vida só

De repente teve medo quando viu o céu cinzento
Era a tempestade e o vento vindo em sua direção
E aí pensou um bocado, até que avistou uma casa
Coisa de contos de fada, residência de uma anciã

Que temporal esquisito, que natureza engraçada
Somente sobre esta casa, somente ali, não chovia
Uma velha contava a história que aprendeu em sua infância
Entre os homens e as crianças, mulheres, ca­bras e crias

Ninguém sabe de onde veio essa história tão antiga
Era mais um dos enigmas que a anciã carregava
E com as pessoas em volta, de semblante atento e sério
Com mágica e mistério, essa velha então contava:

“Num tempo muito distante
Em terras mais longe ainda
Falando uma outra língua
De origem ainda mais remota
Existiu um certo povo
Pessoas como vocês
Mas que conheciam as leis
De voar que nem gaivotas
Voavam pela leveza
De alma e sabedoria
Sabiam que conheciam
As for­ças da natureza
Por isso não tinham ódio
E muito menos doenças
Nem perdão e nem ofensa
Só paz e delicadeza
Conheciam os elementos
As correntes e seus segredos
E isso provocava medo
Nos outros povos vizinhos
É difícil conviver
Com o tempo e a coerência
A paixão e a inocência
A intimidade e o carinho
Um dia um adolescente
Voando por sobre a tribo
Foi posto em mira
E abatido mortalmente
Em pleno vôo
Foram trovões ou foi tiro?
Daí ninguém se entendeu
Nem sabe o que aconteceu
Mas curvaram‑se de dor
Encontraram a poucos metros
Inertes e desesperados
O menino baleado
O peito sujo de terra
E se sentiram indefesos
E alvo de toda inveja
Pois não tinham as estratégias
E as engrenagens da guerra
Com o tempo virou rotina
A matança desses homens
Já não se sabiam os no­mes
Dos que morriam nos ares
Agarravam as mães seus filhos
E os fi­lhos pediam às mães
Escondiam‑se os cães
E o medo tomou os lugares
Mas mesmo assim
Cada mãe continuava a ensinar
A grandeza de voar
E a interpretar os livros
Mas todo dia um menino caía
Que nem cão sem dono
E as mães ninavam seu sono
Como se estivessem vivos
Um por um, iam‑se todos
Como gaivotas feridas
E em nome de tan­tas vidas
Achariam uma criança
A que sobreviveria
Sem mostrar saber voar
E que atravessasse o mar
Para escapulir da matança
Embarcariam a criança
E isso ainda essa noite
Teria que ser à noite
No mais tardar de manhã
O conselho de anciãos
Comunicou à Realeza
Que escolhe­riam a princesa
E que se chamava Mayã
E hoje ela vive entre os homens
Mas jamais se revelou
A não ser que por amor
Um dia possa entregar
De peito aberto o segredo
A um outro povo encantado
Que já esteja preparado
Pro segredo de voar”

A velha acabou a história e fez‑se um vazio imenso
Todos ali, em silêncio. Todos, os olhos culpados
Onde estaria Mayã, se no tempo nos perdemos
E amanhã esqueceremos e em outros contos de fadas?

O viajante gostou e pensou:
“É bom que aprendo mais histórias e lendas
E conto a outros viajantes”
Pegou de novo a estrada, relembrando só, con­sigo

Mas notou que tinha ouvido essa mesma história antes
“Já sei, não era história! Conhecia aquela moça
De olhos negros e doces que lhe acolhera em sua casa
Voltaria atrás de novo e falaria de paz
Seria um viajante a mais, mas um viajante com asas”

Se a história de Mayã é lenda de uma anciã
Ou se na verdade, então, era mesmo aquela moça
Não saberemos tão cedo essa real conclu­são
Porque está nas mãos do tempo e nisso o tempo tem força

Mas tal­vez Mayã esteja sentada bem ao seu lado
Soluçando ali, calada, com os olhos tristes a moça
E você nem se aperceba só por razões de momento
Porque isso exige tempo e nisso o tempo tem força

E quem sabe a guer­ra, um dia, enterre mísseis, canhões
Soldados retornem às mães, pátrias desses filhos teus
E então nós encontraríamos, voando os céus de Teerã
A figura de Mayã, sorrindo e nos dando adeus.


(Texto de Oswaldo Montenegro e Raíque Makcáu)

2 comentários:

  1. A busca da paz também deve fazer-se no interior de cada um de nós,pena que a moça da história viva tão longe e tão inascessível prá nos acolher na nossa agitação.Nas horas de muita aflição o melhor é parar e observar a água revolta e turva e aguardar que a tempestade passe e o lago fique novamente plácido e límpido.Muita paz...

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  2. oi sera q vc teria essa musica para me passar ?
    por favor
    é q o nome da minha melhor amiga é mayã e ela nunk a ouvio e é um dos sonhos dela e eu gostaria de lhe dar esse presente .
    por favor............
    meu e-mail é
    joss-Hime@hotmail.com

    ResponderExcluir

Status: Psicólogo

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