quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Rudia e Pelota



Era uma vez duas mocinhas, por volta de seus 15 anos de idade, amigas inseparáveis, Rudia e Pelota. Foram assim nomeadas por um amigo em comum, devido ao corpinho rechonchudo, cheio de curvas que as duas tinham nessa terra tão cheia de duplas sertanejas.

Rudia era grande amiga do primo de Pelota e assim se conheceram e traçavam vários planos juntas, iam a todos os lugares juntas, só viajavam juntas e uma não fazia nada sem antes comunicar ou chamar a outra. Natal, Réveillon, Carnaval, férias e aniversário eram datas que elas jamais passavam separadas.

Viviam conversando sobre os pretendentes, confabulando, sonhando, se abraçando, rindo muito... esses comportamentos típicos de adolescentes.

Não estudavam na mesma escola, mas passavam as aulas mandando bilhetinhos uma pra outra, contando todos os minutos, todos os detalhes do tempo em que passavam distantes. E não viam a hora de se encontrar pra poderem trocar os papeizinhos e colocarem a conversa em dia.

A relação era invejável mostrando a quem quisesse o quanto aquela amizade era bonita e verdadeira. Faziam planos de crescerem juntas, envelhecerem juntas e ficarem juntas, até que a morte as separasse. Lindo como cena de novela!

Pelota era apaixonada pelo irmão de Rudia. O primeiro namorado de Rudia morava no prédio onde residia Pelota. Os destinos pareciam estar para sempre entrelaçados. Anos se passaram e o amor que tinham uma pela outra só aumentava, elas ficavam cada vez mais cúmplices e companheiras.

Até que um dia, num Carnaval de cidadezinha de interior, Pelota achou que o paquerinha dela estava dando em cima de Rudia e que, pior, Rudia havia “ficado” com ele, em pleno Carnaval de rua, na frente de todos.

Rudia estava na casa dos avós de Pelota, que acusava dura e cruelmente sua suposta amiga de traição, usando palavras agressivas e destilando seu veneno e ignorância, coisas que ferem e deixam marcas eternas.

Ali se desmoronava um castelo que, então descoberto, era de areia. E Rudia, depois de tanto se explicar, até colocar o coitado do rapaz para se “confessar” diante da amiga, nunca mais falou ou viu sua amiga de tantas jornadas.

Depois de muitos anos, Pelota foi fazer faculdade em outra cidade e por lá ficou cinco anos. Rudia também seguiu seu caminho, mas não saiu da cidade e do contato das pessoas que tantas vezes comungaram os momentos de alegria daquelas grandes amigas.

Não sei como era com Pelota, mas Rudia sentia uma dor grande pela perda daquela amiga incomum. Chorava de saudades, pois tudo que restara era uma caixa cheia de bilhetes, cartas e as lembranças de excelentes momentos vividos, divididos com muito carinho e dedicação.

Mas nada como o tempo, o melhor remédio para curar as feridas que a vida nos abre. Ele também deixa vir à tona, nos mostra as verdades que muitas vezes ficam escondidas numa caverna escura e distante, onde só vai quem quer.

Certa vez, Rudia faz uma viagem e faz amizade com uma mocinha que conheceu Pelota, estudou e conviveu com ela, na tal cidade onde ela foi estudar. Esta menina contou a Rudia que conhecia a história das duas e que Pelota tinha tanta raiva de Rudia que se recusava até a pronunciar o nome dela. Quando o fazia, ao invés do nome, a chamava de Pseuda.

Rudia ficou muito triste, contou sua versão da história, mas no fundo ficou feliz, pois sentiu naquele momento que Pelota ainda não a havia esquecido. Por isso, falava tanto de Rudia, mesmo que parecesse ter ódio no coração.

Mais algum tempo se passou e, num momento de nostalgia, Rudia resolveu escrever uma carta para Pelota, se desculpando até pelo que ela não tinha feito, contando o quanto a amiga ainda era importante em sua vida. Sabia que não haveria resposta, mas se sentiu mais feliz em poder deixar falar o coração abertamente.

Isso não foi o suficiente para Rudia saciar a sede que tinha da amiga. Resolveu então ir de surpresa numa manhã, esperar a amiga acordar e dar de cara com ela na sala. Foi lindo! As duas se abraçaram muito, se beijaram, disseram do amor que sentiam uma pela outra, o qual nunca havia acabado. Aproveitaram para se inteirarem um pouco do tempo que estiveram afastadas e mataram uma lasca da saudade que tinham.

Rudia foi embora, imensamente feliz por ter revisto sua amiga que no passado foi tão querida. E a partir dali, nunca mais foi a mesma, porque conseguiu aprender com aquela história muitas coisas importantes.

Sua alma estava lavada, pois entendeu que mais importante do que a amiga perdoá-la, mesmo que fosse por algo que ela não fez, era perdoar a amiga por ter desconfiado dela, de seu caráter, sua índole. Entender que toda a dedicação, o carinho, os momentos divididos valeram a pena porque foram feitos com amor, puro e verdadeiro. E isso existe para ser doado, oferecido, independente de quem seja.

Rudia hoje sabe que não necessariamente o que é bonito, é de verdade, afinal, as aparências sempre enganam. Sabe agradecer por tudo o que a vida lhe traz, porque entende que tudo é transitório e que tudo tem uma razão de ser.

Ontem, Rudia esteve com Pelota. Pelota continua sendo a pessoa vazia e cruel que a amiga nunca enxergou. Não mudou nada. O tempo só lhe trouxe mais idade, porém pouco amadurecimento.

E Rudia... olhou pra ela com muito carinho... cumprimentou-a com um forte abraço... e não sentiu absolutamente nada. Modéstia à parte, saiu com a certeza de que Pelota, na verdade, era um fruto de sua imaginação e que sua vida está e sempre esteve muito além.

Um comentário:

  1. E amiga, tem gente que como a Rudia usa a vida pra aprender e crescer, ao contrário existem, infelizmente, pessoas como a Pelota.Que pena!!Mas, cada um com seu cada um!!
    Beijos.

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Status: Psicólogo

Ao psicólogo não é dado o martelo dos juízes, as prerrogativas dos promotores, nem o bisturi dos cirurgiões, somos pequenos clínicos ...